Dezenove clubes contrataram jogadores depois de o Campeonato Brasileiro ter começado. Alguns complementaram seu elenco com um par de peças, outros taparam buracos nascidos de transferências, muitos redesenharam a composição de seu vestiário. Não foram poucos: 19 entre 20 participantes. Diz a matemática que resta uma exceção. E a exceção lidera a disputa.
O Fluminense não contratou ninguém. Todas as figuras que atualmente vão a campo com a camisa tricolor já eram do clube antes do início do Brasileirão. E isso não é gratuito, ocasional - pelo contrário. É um processo racional, que parte de duas pontas que se entrelaçam para minimizar a margem de erro nas escolhas tricolores: a formação de uma estrutura profissional voltada ao processo de contratações e o aporte financeiro para concretizar as ambições. Simplificando: não basta ter dinheiro e não saber contratar; e pouco adianta saber contratar se não tiver dinheiro para isso.
Esta reportagem analisa como os 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro contratam e como funciona o mercado no qual eles agem. No infográfico abaixo, clicando em cada escudo, o leitor terá um resumo da política e dos mecanismos usados por cada equipe para buscar reforços, além de uma lista dos atletas adquiridos depois de o Brasileirão ter começado - e a situação de cada contratação no elenco.
A pesquisa indica que contratar não é difícil. Difícil mesmo é contratar bem. E contratar bem pede uma estrutura voltada para isso. Dentro deste panorama, surge a notícia boa e a notícia ruim. Primeiro a boa: os clubes brasileiros já perceberam que é fundamental profissionalizar a caça por reforços. A ruim: é um processo que ainda engatinha em boa parte das equipes do país.
Casos e acasos
Não existe um padrão na tática de contratações dos clubes brasileiros. Há casos e casos - ou acasos. Os procedimentos vão de métodos quase científicos a opiniões absolutamente pessoais. Pegando o exemplo de dois dos maiores clubes do Brasil, Corinthians e Vasco, é possível notar a diferença na filosofia - e na capacidade de investimento.
O Corinthians, quando percebe que um jogador de seu banco de dados pode tapar um buraco do elenco, vai em busca de vídeos de quase duas dezenas de jogos dele. Cada observador, em uma equipe coordenada pelo gerente de futebol Edu Gaspar, assiste a duas partidas (de diferentes dificuldades, em diferentes momentos) do atleta e faz um relatório a partir daí. Os dados são cruzados. Deste cruzamento, conclui-se se é um nome a ser aprovado ou não.
Já o Vasco, quando precisa de um boleiro, fica refém de opiniões - vale ressalvar que o clube está reformulando seu departamento de futebol. É muito comum empresários perceberem as carências do elenco e venderem seu peixe à diretoria, que vai aprovar ou não a sugestão. Parte do elenco é formada assim. De resto, vai do gosto dos dirigentes e da comissão técnica. Eles fazem suas observações e ouvem dicas de amigos para contratar determinado jogador. Não há, no clube carioca, o mesmo método do oponente paulista. E nem é necessariamente uma questão de visão de futebol. É de dinheiro mesmo.
- O Vasco, no momento, não tem essa rede. Os jogadores nos são oferecidos. Sabemos que é muito importante, mas demanda algum investimento - comenta Daniel Freitas, diretor executivo de futebol do clube cruz-maltino.
Criar uma rede de potenciais contratações, monitorar os jogadores, analisar sua linha evolutiva em campo, observar números, estudar seu histórico - é tudo um processo de profissionalização, que visa a diminuir a margem de erro na aquisição de atletas (veja abaixo um exemplo simplificado do processo de contratações). Mas o futebol não é uma ciência exata. Por mais forte que seja o filtro adotado pelos clubes em suas análises, erros acontecem. E a opinião de diretores e treinadores está sempre presente, influenciando no processo.
Alguns clubes acabam atrelados ao conhecimento de dirigentes. Em 2006 e 2010, o Inter ganhou suas duas únicas Libertadores. Na primeira, tinha Fernando Carvalho como presidente e Vitório Piffero como vice de futebol. Na segunda, tinha Vitório Piffero como presidente e Fernando Carvalho como vice de futebol. Não é coincidência. Enquanto formava uma base profissional, a instituição se aconchegava na boa noção dos dois cartolas. Um caso exemplar: na primeira fase da Libertadores de 2006, Carvalho, em conversa informal com repórteres, disse que um carequinha do Libertad, do Paraguai, vinha sendo o melhor jogador da competição. Um ano depois, a diretoria colorada soube que o jogador estava acertado com o Grêmio. E mandou um representante às pressas para furar o rival e fechar com o atleta na Argentina. Guiñazu é titular absoluto do Inter desde então.
O problema é quando acontece o contrário. Se o dirigente entende de futebol, ótimo; se não sabe patavinas do assunto, o clube corre risco de se lascar. Em 2004, o Grêmio, com estádio próprio, com torcida participativa, com camisa forte, foi lanterna do Brasileirão, nove pontos atrás do penúltimo. Jogadores e treinadores se sucederam ao longo do campeonato - em vão. Menos de três anos depois, o Tricolor estava em uma final de Libertadores - com o mesmo estádio, a mesma torcida, a mesma camisa. A diretoria é que era outra.
O método empírico, baseado na vivência dos dirigentes, segue preponderante em clubes como Flamengo, Palmeiras e Náutico. Corinthians, Botafogo, Fluminense, Inter e Coritiba são casos de administrações que avançam para se desprender do cartolismo. E muitos outros estão no meio do caminho, adotando métodos para contratações, mas ainda dependentes dos pitacos de diretores.
Um novo jeito de contratar
Faz pouco tempo, não mais do que cinco anos, que ganhou corpo um novo filão no mercado brasileiro: o de diretor executivo. Trata-se de um profissional pago para organizar a casa. É um funcionário com atribuições administrativas - recebe salário para cumprir determinadas tarefas, e auxiliar nas contratações costuma entrar no pacote.
Estes profissionais encabeçam um processo de migração no futebol brasileiro. Os clubes, no esquema do Maria-vai-com-as-outras, aos poucos vão trocando a gestão política pelo comando profissional em seus departamentos de futebol. Ao perceber que os adversários estão modificando suas estruturas e tendo resultados com isso, os dirigentes se obrigam a adotar medida semelhante. Consequência: aos poucos, as decisões deixam de ser exclusividade dos dirigentes políticos (presidentes, vices e diretores de futebol) e passam a ser mais compartilhadas por executivos de futebol.
A diferença entre um e outro é o preparo. O dirigente político costuma ser indicado por um gosto pessoal do presidente - e a torcida fica à mercê das opiniões dele. É um sujeito que geralmente gosta de futebol, que é apaixonado pelo clube, mas que não tem um método em suas observações - e não recebe um tostão pelo trabalho. O executivo traz a reboque a ideia de uma gestão mais ampla. Tem (ou deveria ter) cursos de gestão esportiva em seu currículo. É por causa dele que proliferam pelos principais clubes figuras como as do analista de desempenho, do observador de adversários e do olheiro - e ações como o scout.
A imponência destas novas estruturas depende do interesse do clube em bancá-las. O Fluminense decidiu pagar o preço. Rodrigo Caetano foi contratado como diretor executivo a peso de ouro no ano passado - com salário similar ao dos principais jogadores do elenco. Estava no Vasco, e antes trabalhou no Grêmio. Este ano, foi eleito o melhor executivo do país por empresas de marketing e negócios no esporte. Abaixo dele, o Tricolor estabeleceu uma estrutura de oito pessoas responsáveis pela análise de jogadores que podem ser contratados. Uma delas é Marcelo Teixeira, gerente de futebol, que trabalhou no Manchester United e tem um forte banco de dados, com informações detalhadas de mais de 500 jogadores.
Ter estes profissionais permite que o Fluminense adote estratégias parecidas com a do Corinthians (são os dois mais recentes campeões brasileiros): forma um painel de opções, baseado em análises de diferentes profissionais, e joga estas alternativas em um funil até encontrar o nome que melhor complemente características técnicas, táticas, físicas e comportamentais para o espaço carente no elenco. Assim, o clube pode fazer contratações pontuais, respaldado pela injeção financeira de sua patrocinadora, a Unimed. O Flu tem saúde no cofre para manter seus jogadores. Por isso, não precisa repor vendas. Está aí o porquê de ser o único clube que não contratou ninguém durante o Brasileirão.
- Em 2012, ainda reduzimos nosso elenco, para que jogadores não-utilizados de forma frequente dessem espaço a jovens. Com nosso patrocinador, mantivemos o elenco, renovamos o contrato de quase a totalidade dos jogadores. Com isso, os que vieram, vieram para resolver - explica Rodrigo Caetano.
O Botafogo tenta adotar modelo parecido, mas com suas particularidades - está longe de ter o mesmo dinheiro do rival. Se no Fluminense a figura-chave é Rodrigo Caetano, no Alvinegro as decisões sobre contratações passam por Anderson Barros, gerente de futebol do clube, também um dirigente remunerado. Abaixo dele, há um departamento de análise e estatística, que ajuda a monitorar possíveis reforços e a dissecar atletas que entrem na alça de mira do clube.
O Coritiba vai no mesmo embalo. Tem Felipe Ximenes, executivo de futebol, na coordenação de uma equipe que conta com dois ex-jogadores do clube, Pachequinho e Márcio Goiano, como observadores. Eles têm participação direta na formação do elenco. Atletas como o volante Sérgio Manoel e o lateral-direito Ayrton chegaram ao clube assim.
- A gente tem um grupo de funcionários do departamento de captação, observação e scout que acaba mapeando várias regiões do Brasi. Não é fácil, porque concorremos com outros clubes. Temos que chegar na frente, para na hora de trazer esse atleta, não ter outro clube em cima. Também fazemos observações ao vivo, in loco, e vamos colhendo informações. Temos parceiros que nos trazem alguns detalhes. Nós vemos do que o elenco necessita, o perfil de atleta, aquilo que a gente imagina como bom jogador para o clube - diz Pachequinho.
Outros clubes adotam departamentos parecidos, mas que não estão necessariamente focados em contratações. Eles auxiliam - porém, mais para abastecer algum dirigente do que para sugerir alternativas a ele. São os casos, por exemplo, da Central de Dados Digitais do Grêmio e do Departamento de Análise e Desempenho do Bahia.
É interessante observar também que a figura do executivo começa a eliminar a presença do vice-presidente de futebol em alguns clubes. No Flamengo, não houve um substituto para Paulo César Coutinho, demitido em setembro. Zinho, diretor remunerado, é quem cuida das contratações. No Grêmio, o cargo político está vago desde que Paulo Pelaipe assumiu como executivo de futebol, em agosto do ano passado. Na contramão, está o Inter, que tinha tanto o cargo político quanto o profissional até Fernandão, diretor-técnico, virar treinador do time. Restou Luciano Davi como vice-presidente de futebol - e responsável por negociações, consequentemente. A gerência de futebol está vaga.
Enquanto uns eliminam opiniões, outros agregam. O caso do Santos é único. A Vila Belmiro tem uma espécie de colegiado, com nove integrantes, que delibera sobre as contratações do clube. As negociações são decididas por maioria. O presidente Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro tem poder de veto.
- O Santos tem um modelo de gestão pioneiro no futebol brasileiro, com um Comitê de Gestão formado por sete pessoas de perfis complementares, mais presidente e vice-presidente. As contratações passam pelo Comitê e são decididas de maneira majoritária, mas com a chancela do presidente, que tem poder de veto, já que novos reforços envolvem não apenas questões técnicas, mas financeiras, de filosofia do clube e de planejamento. Geralmente, os nomes são definidos pela comissão técnica e pelo departamento de futebol. As condições gerais são passadas ao Comitê, que analisa a operação como um todo - explica o presidente do Peixe.
Alternativas
Em um mercado competitivo, os clubes buscam alternativas para formar bons elencos sem gastar muito. Claro, nem sempre dá certo. Bahia, Sport e Náutico, por exemplo, entram em um grupo de equipes que precisam esperar o mercado esfriar para partir em busca de boa parte de seus reforços. Afinal, eles não têm dinheiro para competir com concorrentes de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, que por vezes começam a montar seus elencos ainda na temporada anterior - o São Paulo, por exemplo, já tenta contratar Aloísio, do Figueirense, para 2013.
Com menos força, clubes de mercados menos abastados acabam contratando atletas com o campeonato em andamento. Desde que começou o Brasileirão, o Sport buscou 16 jogadores, entre apostas e atletas experientes, mas pouco aproveitados em seus clubes. Demorou para pelo menos alguns deles, casos de Cicinho e Hugo, engrenarem - e o time pernambucano luta contra o rebaixamento. Sem poder competir de igual para igual no momento mais quente das disputas por atletas, resta o que sobrou no mercado, e aí o risco é maior. No Bahia, foram 12 contratações, e apenas Neto é titular. Já o Náutico buscou 13 reforços desde a primeira rodada - entre eles, Kieza, principal jogador da equipe.
- Há momentos em que o mercado fica muito aquecido, e os clubes de menor investimento têm dificuldades. Não pode ir quando está aquecido, porque não vai ter sucesso. Vai ter que esperar desaquecer - resume Paulo Angioni, gerente de futebol do Bahia.
O Figueirense, por anos, usou como estratégia se unir ao empresário Eduardo Uram, um dos principais do país, para formar seu grupo de atletas. O atual elenco tem 12 jogadores ligados ao agente. Mas isso tem um preço. Quando os atletas se destacam, a porta de saída fica mais aberta. No momento, a parceria vive momento de turbulência, já que a administração do clube quer liberdade para negociar com outros grupos ou empresários.
O Inter é especialista em outra fatia do mercado de prospecção: a de jogadores em vias de migrar para a turma dos adultos. Ninguém no Brasil sabe captar tão bem quanto os colorados aqueles atletas que precisam de uma última lapidada antes de ir para o elenco profissional. São jovens de 16, 17, 18 anos, que já se destacam por seus clubes. Eles chegam ao Beira-Rio com salários representativos para a idade, recebem um ou dois anos de aprimoramento no último estágio da base (juniores ou time B) e aí vão para o grupo principal. A seleção brasileira hoje tem três jogadores com patamar de titulares que passaram por esse processo em Porto Alegre: o volante Sandro (agora no Tottenham, da Inglaterra), o meia Oscar (vendido para o Chelsea, também da Inglaterra) e o atacante Leandro Damião.
- A gente tem nossa equipe sub-23, a equipe B, que disputa campeonatos profissionais. Temos um setor de captação muito forte. São oito observadores. Fazemos análises do plantel, as carências, e olhamos atletas que possam suprir isso. No primeiro semestre, analisamos quase todos os Estaduais. Agora, olhamos as Séries D, C e B - explica Jorge Macedo, coordenador geral das categorias de base do clube gaúcho.
Cerca de 20 jogadores chegam anualmente ao Beira-Rio por meio dessa prospecção de jogadores em vias de integrar o elenco profissional. Alguns são espionados desde muito cedo - caso de Oscar, observado desde os 14 anos. Quando estes atletas encontram espaço no time principal, o clube ganha fôlego financeiro para investir em jogadores consagrados - como D'Alessandro, Dagoberto e Forlan, por exemplo. Clubes como o Fluminense começam a usar estratégia parecida.
Tecnologia encurta caminho para contratações
Wyscout. Soccerassociation. MF10players. Os três termos podem soar estranhos para os leigos, mas fazem parte do dicionário de parte dos responsáveis por contratações nos principais clubes brasileiros. São os nomes de sites especializados em otimizar o processo de observação de jogadores. Eles formam um banco de dados com informações detalhadas sobre atletas de tudo que é canto. Dirigentes remunerados mergulham nas páginas em busca de detalhes sobre boleiros que possam interessar ao clube para o qual trabalham.
Os três sites citados acima são usados diariamente por Cícero Souza, executivo de futebol do Sport, e por outros responsáveis por contratações no futebol brasileiro. Um deles, o MF10players, fala português. Foi lançado em maio e já tem como clientes três clubes da Série A: Grêmio, Inter e Ponte Preta, além de executivos (caso de Cícero) e empresários que trabalham com futebol. Foi criado por dois jovens gaúchos: um especialista em informática, Marcelo Nadler, e outro acostumado a transitar no futebol, Martin Carvalho, ex-jogador de Inter e Vasco, filho de Fernando Carvalho.
O Wyscout também é assinado por Botafogo e Corinthians, além de uma penca de clubes estrangeiros - alguns dos maiores da Europa entre eles. A assinatura mensal do pacote completo custa R$ 1,8 mil mensais. O Soccerasssociation é mais barato: R$ 650,00 por três meses.
O GLOBOESPORTE.COM teve acesso à área de assinante do MF10players. É uma mistura de agenda com ferramenta de busca. O sistema permite que se filtre a situação de jogadores de acordo com a necessidade do clube. Se, por exemplo, o Flamengo quiser um meia argentino entre 22 e 25 anos que atue na primeira divisão de seu país, poderá fazer a busca. Em um clique, terá 68 opções. Caso se interesse, por acaso, por Luis María Lagrutta, do Atletico Rafaela, terá acesso a uma página com a lista das últimas partidas do jogador e o histórico da carreira dele, subdividido por minutos jogados, quantidade de partidas, número de vezes em que foi titular, frequência com que entrou no decorrer do jogo ou foi substituído e montante de gols e cartões (veja o exemplo aqui).
Links de vídeos do jogador acompanham a página. O assinante pode criar listas com atletas que caiam em sua raia de interesse - e comparar os prós e contras de cada um a partir dela. Assim, forma uma agenda pessoal de contatos. E já tem em mãos boa parte das informações necessárias para decidir se vale a pena contratar ou não o jogador.
Existem outros sites e programas. O Coritiba usa um chamado Prozone. Ele tem o incremento de aspectos táticos - costuma ser usado por analistas de desempenho para observar adversários e até o próprio time. Uma ferramenta de acompanhamento em tempo real dá ao assinante uma noção imediata do desempenho de determinado jogador na partida que ele está disputando no momento.
Até a seleção brasileira utiliza recursos assim. No caso, não para contratar jogadores, mas para observar aqueles na mira do treinador para futuras convocações. A estratégia começou com Dunga e continua com Mano Menezes. O site utilizado por eles é o ISB, da Alemanha, que teve o ex-presidente do Flamengo Luiz Augusto Veloso como representante no Brasil.
Concorrentes e aliados
O aquecimento do mercado brasileiro fortaleceu a presença de empresas que são, ao mesmo tempo, aliadas e concorrentes dos dirigentes. Grupos empresariais perceberam que poderiam lucrar com o futebol. E passaram a agir nos mesmos moldes de um clube: procurando, contratando e vendendo.
É o caso da Traffic. Antes especializada em marketing esportivo, ela criou, em 2005, o Desportivo Brasil, um clube-empresa que reúne os jovens atletas nos quais se interessa. Dali, eles são repassados a outros clubes. E isso rende lucro.
A descoberta e posterior negociação de jovens atletas foi, por anos, o melhor filão da Traffic. Mas o panorama mudou, e a empresa se viu obrigada a focar em duas outras frentes: a representação de jogadores e a intermediação em negociações. Como os clubes brasileiros passaram a girar mais dinheiro, os elencos ficaram mais exigentes, com contratações pesadas. Encaixar jogadores jovens nos clubes virou tarefa complicada. O jeito foi entrar na roda dos negócios mais caros mesmo.
Mas a mão que afaga é a mesma que apedreja, parafraseando o poeta Augusto dos Anjos. Uma empresa não entra no mercado para rasgar dinheiro. Se a Traffic ajuda a colocar, por exemplo, Conca no Fluminense, vai querer vender o jogador quando pintar uma negociação boa. Foi o caso da proposta da China por ele. Se ela firma uma parceria como a que colocou Ronaldinho no Flamengo, vai querer ver perspectiva de futuro lucro. Uma confusão jurídica rompeu a relação entre a empresa e o Rubro-Negro sete meses depois da chegada do meia-atacante ao Rio de Janeiro.
É a lógica do mercado. E aí os interessem se confundem. A Traffic tem oito observadores que analisam jovens jogadores e concorrem com os clubes por eles. Estes mesmos clubes, tempos depois, podem precisar dela para ter determinado atleta. E fica ciente de que em seguida poderá perder este reforço, porque vê-lo estacionado por muito tempo em um mesmo local não costuma ser o mais interessante para o parceiro do clube. Não por acaso, o investimento em jogadores já rendeu cerca de R$ 180 milhões à Traffic.
Há outros casos. A Brazil Soccer, empresa do empresário Eduardo Uram, passou a coordenar o Tombense, clube mineiro que acaba de subir para a primeira divisão. O banco BMG age em duas frentes: ou como forte financiador de contratações, ou como patrocinador. E há ainda a DIS, braço esportivo do Grupo Sonda, que costuma ter pesada participação em jogadores de alguns dos principais clubes brasileiros - casos de Inter e Santos, especialmente. A saída turbulenta de Paulo Henrique Ganso da Vila Belmiro para o São Paulo teve a influência do grupo comandado por Delcir Sonda. Chegou um momento em que clube e empresa não se entenderam mais, e as mãos que antes afagaram passaram a trocar pedradas - e a oferecer até ameaças jurídicas.
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