Se tem uma coisa da qual qualquer rubro-negro, flamenguista, mulambo ou favelado se orgulha é da irreprochável conduta da torcida do Flamengo. Não apenas nos períodos de bonança em que os mais frívolos entre nós chegam a se cansar de tanto gritar É Campeão!, mas também nos raros períodos de vacas magras, naquelas fases nefastas onde o altaneiro urubu de cima consegue ser atingido pela obra do urubu de baixo. Tipo agora.
E nos últimos tempos tem sido cada vez mais fácil ouvir pelas rodinhas de purrinha e papo furado nas esquinas da internet que a torcida do Flamengo está chata. Não se enfureça ainda, me permita antes aduzir que nem sempre essa perturbadora e ultrajante ideia é colocada em termos condizentes com a linguagem e a polidez que são consideradas de bom tom nas conversas de salão.
A verdade é que os comentários sobre esse tema são em sua maioria chulos, quando não francamente ofensivos. Ou será que nós, que fechamos definitivamente com o certo, não temos mais o direito de nos sentir ofendidos quando lemos ou ouvimos algum gato mestre dizendo que a indomável, revolucionária e sempre positiva Magnética está se botafoguizando? Eu fico pra morrer com essa parada, mas se for pra morrer disso cairei discordando até meu último suspiro.
Não estou insinuando que a torcida do Flamengo, por tudo que já fez, faz e fará, mereça um habeas-corpus preventivo que nos isente de toda culpa. Podem acusar a torcida do Flamengo de tudo, até de ser chata. Motivos não nos faltam para justificar nosso mal humor e nossa intolerância. Mas nunca, nem de brincadeira, cometam a blasfêmia de comparar-nos aos botafoguenses.
Tá com inveja, quer falar mal da maior torcida do Brasil? Tudo bem, pode falar, nós aguentamos. Mas parem com essa estória ridícula, não existe termo de comparação entre duas torcidas que habitam galáxias tão afastadas uma da outra.
Primeiro por uma questão de educação, é de muito mau gosto brincar dessa maneira com um grupo reduzido de sobreviventes que merece todo o respeito que se deve à uma espécie ameaçada de extinção. E em segundo lugar porque a maior característica dos sobreviventes alvinegros é sua incapacidade em acreditar em si próprios enquanto a dos rubro-negros é justamente o contrário, acreditamos por demais em nossos alegados poderes.
E demonstramos esse embaraçoso excesso de autoconfiança a todo momento, quase sem querer. Horas antes do inicio do jogo contra nosso genérico goiano, e já sabedores da lamentável escalação com 4 volantes para encarar o perigoso lanterna da competição, eram muitos os rubro-negros confiantes em vitórias, retomadas e goleadas. É por isso que os observadores mais atentos da pujança da nossa torcida nos diagnosticam como portadores de um incurável complexo de superioridade.
E foi com esse espírito indômito e esperanças injustificadas que muitos de nós se postaram diante do aparelho de televisão para um domingo de futebol. Logo depois da lombra do almoço tivemos o esperado fim da Eurocopa. E no final da tarde tivemos o desesperado fim da picada.
Quem teve disposição e estômago para assistir ao chocolate na final e ao jogo do Flamengo em seguida viu com clareza que o Flamengo de Joel se inspira na Espanha. Se inspira nos bicampeões europeus pra poder fazer tudo ao contrário. O Flamengo de 2012 fez da anti-posse de bola uma forma de expressão. Nossos jogadores não hesitam um segundo sequer em se livrar do balão incandescente, que parece lhes queimar os pés.
Que pelada tétrica! Como pode ser possível que um time inteiro jogue tão mal? Não acredito em má fase, azar ou qualquer outro motivo pertencente ao terreno do sobrenatural. Como sou um primitivo, incapaz de entender as nuances e de decifrar as idiossincrasias próprias do futebol profissional, fico achando que os caras do time estão jogando deliberadamente mal com o único intuito de ferrar com o Joel. Principalmente porque eles já fizeram a mesma canalhada antes com Cuca, Andrade, Rogério, Silas e Luxemburgo.
Porque jogar mal daquele jeito que o Flamengo jogou não é algo natural nem mesmo entre os perebas vocacionais, é preciso treinar, e com afinco, para alcançar aquele nível de incompetência. É preciso se esforçar para errar tantos passes, é preciso um raro condicionamento mental para se esquivar tão completamente dos deveres da marcação e da cobertura.
E a esse comportamento deplorável e anti-rubronegro dos jogadores Joel respondeu com um ataque covarde ao patrimônio do clube. Não dá pra aliviar com palavras mais suaves, mas o que o nosso futuro ex-treinador fez foi lançar o jovem Adryan na fogueira. Por sorte brilhou a estrela do moleque, que com talento e pureza de coração nos salvou de mais um vexame histórico.Ponto pra ele.
Mas já estamos cansados de saber que uma andorinha só não faz verão. Pouco vale contar com o jovem Adryan em campo se ele, além dos adversários sedentos de glória, ainda precisa enfrentar legiões de Wellintons, Marllons, Caneladas e Amarais. É uma luta muito desigual.
Apesar de termos alcançado até um improvável terceiro gol contra um fraquíssimo oponente, é aos sábios macróbios da International Board, que definiram na Regra 7 a duração das partidas de futebol masculino em apenas 90 minutos, que devemos a vitória. Se houvessem mais 10 minutos de jogo e fatalmente teríamos levados mais um ou dois gols. Como vimos acontecer com esse mesmo time nesse mesmo Vazião contra o Olímpia e o Internacional.
Há quem diga que com esse grupo de jogadores nem o espírito de Rinus Michel incorporado no Guardiola daria jeito. E que mandar o Joel embora não nos traria qualquer vantagem imediata. Não sei o quanto estes podem estar certos, mas sei que a atuação da nossa mulambada nesse domingo assustaria qualquer candidato ao emprego.
E há os que dizem que a vitória manteve a cabeça de Joel colada ao pescoço pelo menos até o Fla-Flor assim como os dois gols de falta no mesmo semestre valeriam a renovação do contrato de Canelada, com cláusula pétrea de titularidade, até 2016.
Mas a experiência nos ensina que o que esse pessoal fala não se escreve. Muito pelo contrário, geralmente acontece exatamente o contrário do que eles afirmam. É melhor confiar desconfiando. Como vocês sabem, credibilidade é como um hímem, depois que se perde é irrecuperável.
E ainda dizem que a torcida é chata.
Mengão Sempre
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