Deixemos o Brasil em segundo plano por algumas linhas. Vale pedir licença, nesta segunda-feira, àquele desejo de sempre querer saber primeiro dos acontecimentos verde-amarelos nas Olimpíadas. Adiantamos que foi um dia ruim, mas seria insensibilidade não ressaltar, antes de qualquer episódio, o drama de alguém tão distante, tão desconhecida, tão indiferente. Em situações normais, pouco nos interessaria uma sul-coreana, uma esgrimista, uma entre tantas atletas que cruzaram oceanos em busca de um sonho olímpico. Mas a situação de Shin A Lam não teve nada de normal. Ela protagonizou os momentos mais tocantes dos Jogos de 2012 ao viver 100 anos de solidão em cerca de uma hora, com os olhos do mundo absolutamente focados nela – tão acompanhada e tão abandonada ao mesmo tempo.
Explica-se. Em uma das semifinais da categoria espada, Shin A Lam vencia a alemã Britta Heidemann até o último piscar de olhos na disputa. Com o cronômetro parado em um segundo, a europeia partiu para o ataque. Foram quatro avanços contra a asiática, e o último foi considerado válido. Mas a sul-coreana discordou. Achou que o tempo estava encerrado. E começou, ainda coberta pela máscara de proteção, a soluçar diante do público, em um pranto de raiva e decepção.
O treinador dela entrou com recurso. E ali ficou a esgrimista, parada, esperando. Acontece que ela não podia deixar o local do duelo. Se fizesse isso, pelas regras da competição, admitiria a derrota. Teve que ficar ali, sozinha, chorando, aguardando um milagre, por minutos e minutos e minutos. Para entrar com recurso, era preciso pagar, e essa burocracia espichou o tempo em que a atleta ficou sentada, com uma trilha sonora interminável de fundo (chegava a soar macabro ouvir as batidas agitadas da música ambiente), enquanto os árbitros decidiam se ela poderia disputar o ouro ou não.
Ela não podia. O recurso foi negado. Os 100 anos de solidão de Shin A Lam, parafraseando o título do principal livro do escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez, resultaram em não mais do que uma disputa pelo bronze. E ela perdeu. Ficou sem medalha. Ficou feito um manequim em prantos, parada diante do mundo, em vão. Ou quase em vão: ela foi ovacionada pelo público.
Para esquecer quase tudo
Se fosse possível trazer para o esporte brasileiro aquele delírio do filme “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças”, em que é possível apagar partes desagradáveis da memória, não seria uma má ideia usar o mecanismo em algumas fatias desta segunda-feira. Foi um dia dominado por derrotas - para mais esquecer do que lembrar - e que fez o Brasil cair para 12º no quadro de medalhas. A liderança segue com a China, com 17 (nove de ouro, cinco de prata e três de bronze), seguida pelos Estados Unidos, também com 17, mas com menos ouros - cinco, além de sete pratas e cinco bronzes.
O vôlei feminino perdeu. É bem verdade que enfrentou a melhor equipe do mundo. Mas os 3 a 1 sofridos diante das americanas incomodaram mesmo assim. O segundo set brasileiro, com derrota por 25 a 17, apresentou uma sucessão de erros. A ressalva foi a vitória no terceiro set e os momentos de luta no quarto período – sob os olhares de Kobe Bryant, astro da NBA. Foi uma derrota justificável, mas o Brasil gastou sua cota de erros. Se repeti-los em jogos eliminatórios, pode pagar caro.
No basquete, as meninas começaram bem e souberam encarar de frente a Rússia, time muito superior. Mas a esperança de vitória não durou muito tempo. O Brasil perdeu por 69 a 59 – seu segundo insucesso em uma disputa que começa a render ameaças de eliminação precoce.
Na natação, Joanna Maranhão conseguiu a última vaga para as semifinais dos 200m medley. Mas não passou daí. Ficou em 15º no geral. Agora, resta a ela a disputa dos 200m borboleta.
O judô também apresentou frustrações. Rafaela Silva foi desclassificada por conta de um golpe ilegal, a catada de perna, na luta contra a húngara Hedvig Karakas nas oitavas de final da categoria peso-leve. Ela desabou em choro. Bruno Mendonça foi outro a cair nas oitavas. Ele foi eliminado pelo holandês Dex Elmont nos pesos-leves.
Até na vela o dia foi negativo. Robert Scheidt e Bruno Prada ficaram em nono na primeira regata e em sexto na segunda. Com isso, perderam a liderança da classe Star ao final do dia. Agora estão em quarto entre 16 barcos. A liderança é dos velejadores da casa, os britânicos Iain Percy e Andrew Simpson, fortes candidatos ao ouro.
Mas houve boas notícias também. O boxe trouxe duas: a classificação de Yamaguchi Falcão e de Julião Neto às oitavas de final. O primeiro bateu o indiano Sumit Sangwan no meio-pesado. O segundo superou Pak Jong Chol, da Coreia do Norte, no peso-mosca.
Vitória também no handebol. As meninas bateram Montenegro por 27 a 25. Foi o segundo triunfo delas na largada dos Jogos.
Mas os momentos mais animadores estiveram no vôlei de praia. Juliana e Larissa enfrentaram a boa dupla alemã formada por Holtwick e Semmler e venceram por 2 sets a 0, parciais de 21/18 e 21/13. As brasileiras se cobraram muito, mostraram irritação com seus erros, mas deram mais um passo rumo ao ouro. Foi a segunda vitória delas nos Jogos, caso parecido com o de Ricardo e Pedro Cunha, que bateram os britânicos Garcia-Thompson e Grotowski por 2 sets a 0, com parciais de 21/17 e 21/12.
Adolescentes mandam na água
Na natação, foi um dia para as adolescentes. Três meninas com menos de 18 anos (uma de 15, uma de 16 e uma de 17) roubaram a cena. Destaque para a lituana Ruta Meilutyte, a mais nova do trio. Ela foi vencedora dos 100m peito. A americana Missy Franklin, 17, é a nova dona da medalha de ouro nos 100m costas. E a chinesa Shiwen Ye, 16, voltou a assombrar. Bateu o recorde olímpico nas semifinais dos 200m medley, com 2m08s39. Ela já havia superado a marca mundial nos 400m medley no sábado.
Entre os homens, o francês Yannick Agnel garantiu seu segundo ouro. Depois da arrancada que resultou em vitória sobre os Estados Unidos nos 4x100m livre no domingo, ele ganhou os 200m livre, à frente do sul-coreano Taehwan Park e do chinês Yang Sun. A decepção ficou por conta do americano Ryan Lochte, que terminou em quarto.
Mas os americanos fizeram dobradinha nos 100m costas. Matthew Grevers venceu e bateu o recorde olímpico. A prata ficou com seu compatriota Nick Thoman. Além disso, Michael Phelps foi o melhor em sua semifinal nos 200m borboleta. A final da prova é nesta terça.
Aplausos para o mais lento e outras curiosidades
A repescagem do skiff no remo rendeu uma cena inusitada nesta segunda-feira.Hamadou Djibo Issaka, do Níger, foi o atleta mais aplaudido do dia. E o último colocado. Ele cruzou a linha mais de um minuto depois do penúltimo, o salvadorenho Roberto López, e quase dois minutos atrás do atleta mais rápido nas eliminatórias, o belga Tim Maeyens. A torcida reconheceu o esforço do atleta, que pratica o esporte há apenas três meses. Ele foi aos Jogos de Londres graças a um convite do Comitê Olímpico Internacional destinado aos países menos desenvolvidos no esporte.
Na ginástica, com a presença dos príncipes William e Harry na torcida, a Grã-Bretanha foi medalha de bronze por equipes no masculino. Mas a disputa teve uma situação parecida com a da esgrimista sul-coreana. O Japão entrou com um recurso depois da apresentação de Kohei Uchimura na prova de cavalo com alças e conseguiu mudar seu resultado, passando de quarto para segundo. O público vaiou a decisão. Quem se deu mal foi a Ucrânia, que estava em terceiro e perdeu uma posição.
No basquete, outro momento inusitado. No jogo entre França e Austrália, um arremesso desde o campo de defesa fez o time da Oceania levar a disputa à prorrogação. Mas o lance raro de Belinda Snell foi em vão. No tempo adicional, as francesas ganharam por 74 a 70.
Quem não quer aceitar que a ida aos Jogos seja em vão é a britânica Kate Walsh, capitã da seleção de hóquei sobre a grama. Ela levou uma tacada de uma japonesa, quebrou a mandíbula e teve que passar por cirurgia, mas diz que seguirá na competição. A questão é que a disputa termina já na próxima segunda-feira. Olhando a foto abaixo, é de se admirar a vontade da jogadora.
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