“Ó eu aqui, p*!”. Com a voz rouca, Oscar Schmidt surge por trás do batalhão de jornalistas no quintal de sua casa, em Santana de Parnaíba, e se surpreende com o número de microfones à sua espera. Um boné bege ajuda a esconder a grande cicatriz em sua cabeça, única marca visível da batalha mais complicada de sua vida. As lágrimas, que se tornaram frequentes em vitórias e derrotas, ficaram restritas aos tempos de jogador. Depois de uma cirurgia para a retirada de um tumor maligno do cérebro, no fim de abril, Oscar prefere sorrir. Admite, sim, o medo da morte. Mas garante ter força suficiente para não desistir agora.
- Eu estou curado, curadíssimo. Fiz uma palestra na terça-feira. A palestra foi linda, já voltei a trabalhar. Não vejo nada diferente. Muita gente fala que vai vencer, e a maioria não vence, mas eu vou. Não chorei em nenhum momento. Choro muito menos agora. É um tumor pequeno, grau 3, mas malvado. Se eu deixar, ele não sai. Mas não vou deixar. Mesmo que eu não consiga, eu vou tentar de todos os modos. Esse tumor pegou o cara errado mesmo – garantiu o ex-jogador.
Oscar já havia sido operado, em 2011, para a retirada de um tumor de grau 2 (na escala de 1 e 4). No entanto, em uma ressonância realizada durante o monitoramento periódico, foi constatado um novo aparecimento, agora em grau 3, o que exigiu a nova cirurgia. Ele reconhece que, apesar de pequeno, o seu tumor é perigoso, mas afirma que não se deixou abater.
Em quase quarenta minutos de conversa com a imprensa, foram inúmeras risadas. Nenhuma lágrima. Além da cicatriz na cabeça, Oscar diz que a única mudança em sua vida foi ter passado a rejeitar o gosto dos refrigerantes. Aos 55 anos, o ex-jogador se diz um “extremo otimista”. Desde a primeira cirurgia, passou a se preparar para outra grande emoção: a festa de inclusão de seu nome no Hall da Fama de basquete, em setembro, nos Estados Unidos. E, para isso, foi até Londres buscar seu terno para a celebração.
- Esse é um ano incrível. A pior notícia e a melhor. Vou estar lá (na festa do Hall da Fama). Essa vai ser a maior vitória da minha vida. Depois da primeira operação, passei a não guardar mais dinheiro. Fiz um terno em Londres, que vou usar na festa. Demorou quatro meses. Foi uma grana, em pounds, hein? Mas tinha que fazer lá – brincou o ex-jogador.
Oscar iniciou o tratamento logo após a cirurgia. Desde então, tem enfrentado sessões quase diárias de quimioterapia e radioterapia. Deve seguir com os medicamentos por mais um mês. Depois, passará por novos exames para certificar de que o problema ficou para trás.
- Prognóstico não me interessa. Minimamente. Estou sentindo enjoo, mas estou tomando remédios contra isso. Preciso fazer 30 aplicações das duas coisas. Do jeito que eu treinei, isso aqui é muito mais fácil. É só um remedinho e pronto.
Quando detectou o primeiro tumor, Oscar estava em uma viagem com a família, em Orlando. Tomava um banho na banheira do hotel quando desmaiou. Acordou já na ambulância, amparado pela família. O Mão Santa admite o baque de sua mulher e filhos à época que a doença foi constatada. Diz, inclusive, que hoje pensa que talvez tivesse sido melhor não retirar o tumor benigno. “Eu ficaria mais maluco, só isso”, brinca. Agora, porém, garante que é ele quem leva animação à casa.
- Sou eu que consolo todo mundo aqui. Pode ter certeza.
Oscar diz não saber os motivos da doença. Em uma vida regrada, afirma nunca ter feito nada que pudesse ter causado o câncer. Mas ele não lamenta. Prefere celebrar todas as conquistas da carreira. Admite, no entanto, um arrependimento:
- Nunca fumei, bebi, droguei, dopei. Nunca fiz extravagância nenhuma. Uma mulher só. Se tinha um cara exemplo para viver os anos 90, sou eu. Vai entender. . Minha vida foi tão bonita, repleta de coisas. Isso aqui eu vejo o carinho. Nunca tive tanta mensagem de apoio. Nunca soube que era tão querido.. Eu tinha que ter metido bola de três em 1988. Mas foi tudo muito bonito – disse o ex-jogador, lembrando da partida contra a União Soviética, nas quartas de final dos Jogos de Seul.
Agora, Oscar se dedica às palestras motivacionais que tem feito. Na última terça, retomou os trabalhos em uma faculdade de São Paulo. Já tem outra marcada para o próximo dia 10, em uma empresa. Costuma cobrar entre R$ 27 e R$ 40 mil, mas pensa até em aumentar. “É uma palestra de alguém que está lutando para não morrer, né?”, brincou. O Mão Santa garante: está pronto para tudo.
- Se tiver de abrir a cabeça 20 vezes, vou abrir.
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Recordista de pontos
Oscar é considerado um dos maiores jogadores de basquete de todos os tempos. O ex-atleta é o recordista mundial de pontos, com 49.703, superando o americano Kareem Abdul-Jabbar. O recorde é extraoficial, pois não havia súmulas de todos os jogos de Oscar no Brasil.
O Mão Santa foi o líder de um dos maiores feitos do basquete mundial. Em 23 de agosto de 1987, o Brasil foi campeão dos Jogos Pan-Americanos ao bater os Estados Unidos em Indianápolis, casa dos americanos, na final.
Oscar também foi bronze no Mundial de 1978, nas Filipinas. O ex-jogador participou de cinco Olimpíadas (Moscou, Los Angeles, Seul, Barcelona e Atlanta). A melhor colocação do Mão Santa com a seleção brasileira foi um quinto lugar, em Barcelona, 1992, e Seul, 1988.
O ex-jogador começou sua carreira na base do Palmeiras e jogou no Mackenzie. Como profissional, teve nova passagem pelo Verdão, atuou por Sírio (SP), Caserta e Pavia, da Itália, além do Valladolid, da Espanha. Na volta ao Brasil, jogou pelo Corinthians (SP), Bandeirantes (SP), Bauru (SP) e se tornou um dos maiores ídolos do basquete do Flamengo (RJ).
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