O nosso pobre e desassistido campeonatinho rural é um dos mais eloquentes exemplos do desperdício de tempo, talento e dinheiro ao qual o ciclópico Flamengo Bombador de IDH se sujeita por insistir em acreditar na lenda de que amadores supostamente bem intencionados são capazes de gerir um negócio multimilionário em um ramo do entretenimento ultracompetitivo como o futebol profissional. O hediondo estupro consensual do Maracanã marcou o inevitável declínio técnico e econômico daquele que um dia foi o campeonato estadual mais importante do país. Hoje, o Maracanã é a ruína mais cara da Terra e os jogos do carioqueta além de serem muito ruins têm público ridículo, geralmente inferior ao dos páreos no Jockey Club.
Tivesse o Flamengo um dono, ou ao menos se fosse administrado como se tivesse um, e já teríamos abandonado essa palhaçada de Carioca há muitos anos. E seríamos um clube muito mais rico do que somos. Pois para obter receita muito superior à obtidas nos carioquetas chumbregas da era do pay-per-view bastaria que disputássemos dois amistosos por mês com casa cheia pelo Brasil e teríamos problemas sérios para fechar as nossas malas estufadas com o dinheiro das bilheterias. Isso pra não mencionar o que ganharíamos a médio e longo prazo espalhando a semente rubro-negra pelo mundo.
Fala sério, estamos em 2012, Campeonato Carioca pra quê? Se tem um time que não precisa mais disso é o Mengão. Somos sabidamente o Rei do Rio, o Papaizão Severo e o Grande Doutrinador dos Carioquetas, títulos honoríficos reconhecido pela FIFA, pela ONU, pelo Vaticano e pelo Aiatolá Khamenei. Enquadramos geral nos domínios dos papa-goiabas, não apenas detendo a hegemonia incontestável no estado e possuindo folgada vantagem no confronto direto sobre todos os adversários, mas também esculachando as nossas barangas municipais com irreprochável assiduidade. A verdade é que o Flamengo ficou grande demais para o carioqueta.
Mas ainda que o Flamengo se permita cumprir seu destino manifesto de líder mundial, conquiste o planeta e o pinte de vermelho e preto para todo o sempre, o que ocorrerá mais cedo ou mais tarde, não podemos admitir que a palhaçadinha arcoirista, pestilência sócio esportiva já erradicada uma vez pelo nosso ímpeto saneador, volte a vicejar em nossa própria aldeia. O que significa dizer que ainda que achemos o carioqueta uma bela merda, que só dá preju e nos distrai da Libertadores, temos que vence-lo.
Como já demos mole inaceitável na Taça Guanabara para vencer a porcaria do carioqueta só nos resta passar o rodo na Taça Rio. E para azar dos crossdressers e simpatizantes o Florminense Tennis Club, decadente agremiação burguesa que se dedica prioritariamente aos saltos ornamentais, à patinação artística e ao aluguel de salões nas Laranjeiras para bailes de debutantes é a bola da vez.
Pra vocês verem como as coisas são paradoxais gastei 300 palavras falando sobre o quanto eu detesto o carioqueta, mas ao mesmo tempo acho o Fla x Flu, o mais carioca dos clássicos, absolutamente sensacional. Centenário, disputado desde os tempos em que os quadris femininos faziam com que uma menina de catorze anos tivesse que se pôr de perfil para atravessar uma porta, o Fla x Flu é tão colossal que o seu significado extrapola o vasto campo do futebol.
A disputa futebolística em si já saiu de cena faz tempo no Fla x Flor. O que é até natural quando se confrontam dois times pertencentes à divisões distintas. Mesmo antes do Florminense delinquir pela primeira vez ao não se apresentar às autoridades carcerárias e cumprir sua pena na Série B de 1997, muito do fulgor técnico dos empolgantes Fla x Flus dos anos 30, 40, 50 tinha se esmaecido com o advento de Zico. Durante os 17 anos do seu reinado o impiedoso 10 da Gávea empalou o Florminense com tamanha crueldade e frequência, apequenando ainda mais o já não muito grande tricolor, que o Fla x Flor deixou de ser o clássico mais importante da cidade. Mas continua a ser o mais importante do mundo.
O Fla x Flor pode ter perdido importância futebolística, mas ainda é o clássico dos grandes contrastes. Envolve a imortal disputa filosófica, moral e comportamental entre dois estilos de vida diametralmente opostos. É a disputa campal entre burguesia e proletariado, darwinistas contra criacionistas, charm x funk, compra pronto x faz em casa, fatímidas x abássidas, Windows x MacIntosh.
Nesse embate o Flamengo representa os valores morais mais caros aos brasileiros, o orgulho da origem humilde, a coragem para enfrentar os poderosos, as conquistas através do trabalho duro, o respeito à lei, à ordem e ao combinado não é caro. E o Florminense é o jeitinho dos ricos brasileiros não pagarem as contas, a virada de mesa, o descumprimento dos contratos e a tentativa de ocultar a realidade com maquiagem e champanhotas.
São essas poderosas cargas opostas que fazem do clássico interdivisional um patrimônio da cultura nacional e nos impelem a mais uma vez atravessar os túneis e as vias expressas da cidade para assistir ao Fla x Flu #237 (em Cariocas). Porque se fosse depender do futebolzinho muquirana que o Mengão tem jogado eu ficava em casa. Mas a bruxinha que era boa e que andou barrando muita gente no nosso meio campo está se revelando uma verdadeira revolucionária. Depois de tirar do Fla x Flor Felipe, Léo Moura, Airton, Willians, Maldonado, Camacho e Renato Abreu, agora resolveu barrar o Welinton.
Tudo indica que teremos em campo Paulo Victor, Gustavo, Gonzalez e David Braz; Galhardo, Muralha, Luiz Antônio, Ronaldinho Gaúcho e Junior Cesar; Vagner Love e Deivid. Você sabe o que isso pode significar? Eu não sei. Mas a espetacular Nivinha deve saber.
Pra encerrar, queria dar o papo pro Ronaldinho Gaúcho. Porque fizeram um tremendo escândalo sobre as vaias que ele recebeu. Como se fosse a coisa mais extraordinária do mundo. Não são mesmo, e todo grande jogador já teve ou terá sua cota de vaias e ovos. Como dizia Nelson Rodrigues, o único grande ídolo dos tricolores, “ A grande vaia é mil vezes mais forte, mais poderosa, mais nobre do que a grande apoteose. Os admiradores corrompem.” Falou tudo
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