20 de set. de 2012

Adriano: da favela a Milão, morte do pai, assassinato e chantagens


header materia Todas as Faces do Adriano (Foto: infoesporte)
Adriano sempre cita dois episódios como determinantes para seu abalo psicológico e emocional. Primeiro, o choque de realidade ao deixar a favela da Vila Cruzeiro para ser nomeado Imperador na Itália; depois, segundo ele, a morte do pai, em 2004, o transformou em outra pessoa. Mas um caso nebuloso ocorrido em 2006, às vésperas da viagem com a Seleção Brasileira para a Copa do Mundo da Alemanha, causou outro forte baque, que o atacante não tornou público.
Dias antes de embarcar para a Alemanha, Adriano foi festejar com os amigos da Vila Cruzeiro na boate Quebra-Mar, no início da orla da Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. O grupo, segundo versão de pessoas próximas ao jogador, contava com alguns foragidos da Justiça. Ao deixar a boate, a comitiva do Imperador foi abordada por policiais e levada para um local nas redondezas de Realengo. Um dos grandes amigos do atacante tentou fugir, foi baleado e morreu. Segundo relatos de quem estava presente, há registros fotográficos do Imperador no local em que aconteceu a morte. A partir daí, o jogador conviveu com tentativas de extorsão, o que teria contribuído para desestabilizá-lo emocionalmente no Mundial daquele ano.
 
- Adriano começou a ser vítima de chantagem. Foi complicado, mas ainda acredito que a morte do pai tenha sido o pior momento – recordou um dos amigos que estiveram presentes à festa na boate, em 2006.
Dificuldades no começo de carreira
Mas a história como jogador de futebol começa bem antes da Copa de 2006. Na época, os problemas eram apenas financeiros.

Quando Adriano tinha sete anos, Rosilda resolveu desvendar a Zona Sul do Rio de Janeiro e foi até a Gávea para matricular o filho na escolinha do Flamengo. Ela mentiu para o marido, dizendo que as tias do garoto arcariam com os gastos de matrícula e mensalidade. Com isso, precisou fazer hora extra no trabalho para conseguir aumentar o salário mínimo que recebia e passou a vender doces, legumes e churrasquinho. Como office-boy, Mirinho também tinha a renda baixa.

Além do Flamengo, Adriano fez escolinha na Urca e futebol de salão no Grajaú Country Clube. Na Gávea, como lateral-esquerdo, quase foi dispensado. Tentou a sorte na zaga e no meio-campo até chegar a centroavante, sua posição de origem nas peladas na favela.

Da Penha à Gávea era uma via-crúcis. Trem lotado até a Leopoldina, depois ônibus com gente pendurada nas portas. Rosilda garante que nunca temeu que o filho saísse do caminho do futebol e entrasse na trilha do tráfico na Vila Cruzeiro:

- Não, juro que nunca tive esse medo. Sempre lutei para preencher o espaço dele com o futebol.
Profecia sobre futuro do jogador
Foi em um culto evangélico que Rosilda ouviu uma profecia. A mãe de Adriano acabara de entrar na igreja quando um pastor bradou:

- Chegaram uns visitantes, e Deus manda falar que tem um atleta que o mundo todo vai saber quem é, vai separar honra e glória do senhor. Vai ser manchete de jornais. E por esta semana vai ter uma grande vitória.
foto 1 - materia 3 - Adriano (Foto: infoesporte)
Pouco tempo depois, Adriano foi campeão mundial pela seleção brasileira sub-17. Em 2000, tornou-se profissional do Flamengo. Com 18 anos, foi convocado para a seleção principal para o jogo contra a Colômbia, pelas Eliminatórias da Copa de 2002. Em 2001, Adriano acabou negociado com o Internazionale, da Itália. Logo na estreia, marcou um gol contra o Real Madrid, no Santiago Bernabéu.

À época, o jogador morava num hotel, e uma das primeiras palavras que aprendeu foi “tosta”, que era um sanduíche tipo misto-quente. Com dinheiro no bolso, mas sem o italiano na ponta da língua, era “tosta” no cardápio.
O atacante passou por Parma, Fiorentina e voltou ao Inter em 2004, quando ganhou o título de Imperador.

A profecia do pastor se concretizou. Todo mundo sabia quem era Adriano. O jogador virou manchete de jornais, mas nem sempre como fonte de boas notícias.

Efeitos de uma bomba no psicológico

A vida mudou. Da favela, ele passou a morar na Itália; o trem e ônibus cheios deram lugar a diversos carrões na garagem. A família ficou no Brasil. E Adriano sofreu o primeiro grande baque com a mudança brusca de realidade e a ruptura com o berço familiar.
 
Eu conquistei muito rápido as coisas, para um menino que não tem nada depois tem o mundo...
É difícil controlar"
Adriano
- Muitos jogadores saíram do Brasil, foram para o exterior e não tiveram problemas. Outros, como Adriano, não tiveram suporte para o que vem de novo, sucesso, glamour. Cada caso é um caso. Junta isso com a perda do pai, os ingredientes funcionam como uma bomba. Ele teve componentes específicos que não permitiram uma boa condução da fama, da condição de ídolo e do título de Imperador, que é muito forte. Chega uma hora em que a pessoa fica sem um norte – analisou o psicólogo Paulo Ribeiro, que acompanhou Adriano em 2009, quando ainda era funcionário do futebol do Flamengo.

Adriano confessa que a mudança de realidade não foi bem absorvida:
- Consegui ter um nome muito rápido, fui para a Itália muito novo. Consegui conquistar nome. Isso me transformou numa pessoa diferente. Diferente do Adriano da favela, que não tinha nome, que tinha que ralar... Eu conquistei muito rápido as coisas, para um menino que não tem nada depois tem o mundo... É difícil controlar.
foto 2a - materia 3 - Adriano (Foto: infoesporte)
Em 2004, a segunda grande pancada que atingiu Adriano. Um mês depois de conquistar a Copa América, Almir Leite Ribeiro morreu de infarto, a pancada mais forte para o filho que tinha o pai como seu fiel escudeiro, conselheiro e responsável por conter os excessos do jogador.
- Ali deixei de ser o Adriano que era antes – confessou o jogador, que começou a abusar do álcool.

Ainda assim, até 2006, o atacante teve número impressionante de gols, de partidas disputadas por temporada, estava no auge da forma física, era titular da seleção brasileira, fazia um gol a cada dois jogos na Itália. Em 180 participações, foram 91 gols.

Veio a derrota na Copa, e a consequente derrocada de Adriano. Em outubro de 2006, em má forma no Inter, o atacante foi liberado pela diretoria para “esfriar” a cabeça no Rio de Janeiro. No entanto, em vez de descansar, atacante foi visto em bailes funk e andando pelas ruas da cidade na garupa de uma moto. Ao mesmo tempo, um jornal sueco divulgou fotos do Imperador cercado de mulheres, cigarros e bebidas alcoólicas.
Convivi com o Adriano muito tempo. É um cara espetacular, mas o problema dele é médico. Ele precisa de cuidados médicos especializados há muito tempo"
Gilmar Rinaldi
No início deste mês, o ex-empresário de Adriano Gilmar Rinaldi participou de um programa de televisão e apontou uma solução para o jogador, que dias antes faltara a dois treinos do Flamengo:

- Convivi com o Adriano muito tempo. É um cara espetacular, mas o problema dele é médico. Ele precisa de cuidados médicos especializados há muito tempo. Se não fizer isso, não acredito.

Poucos dias depois, Gilmar preferiu o silêncio:

- Me machuquei muito com esse assunto.

Depois de tantos problemas, Adriano adotou uma espécie de mantra atualmente:

- Só faço mal a mim mesmo.

Mas os respingos acabaram por atingir a família.
- Minha mãe e avó são duas guerreiras, tem que bater palmas – confessou Adriano, depois de diversas polêmicas absorvidas pela família.
*Nesta matéria, há trechos de entrevistas inéditas de Adriano, de sua mãe, Rosilda, e de sua avó, Wanda, concedidas ao repórter Tino Marcos, da TV Globo, antes da Copa do Mundo de 2010

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