Algumas emoções que sentiu na vida
Léo Moura gostaria de nunca esquecer. A primeira vez que chutou uma bola, o nascimento das duas filhas, a primeira vez que vestiu a camisa do Flamengo. De junho de 2005 para cá, foram 399 partidas pelo Rubro-Negro. Ele não imaginava chegar tão longe. O jogador que tinha fama de cigano ao se apresentar ao clube da Gávea virou referência, símbolo de uma geração vitoriosa, capitão. A partida especial, de número 400, será neste domingo, contra o Inter, em Porto Alegre.
Momentos de Léo Moura nos últimos sete anos (Foto: Editoria de arte / Globoesporte.com)
Já são sete anos de Flamengo. De um casamento que deu certo, como ele costuma dizer. Títulos que não cabem mais nos dedos de uma das mãos. Sem contar os turnos do Carioca, são seis. Quatro estaduais (2007, 2009, 2008 e 2011 – este último invicto), a Copa do Brasil de 2006 e o Brasileiro de 2009. Taças que o colocam como um dos mais vitoriosos da história do clube.
- Se eu disser que imaginava ficar sete anos aqui no Flamengo, eu posso me equivocar. Nunca imaginei ficar sete anos num clube só. Meu sonho era um dia jogar profissionalmente no Flamengo, mas entrar para a história de um clube como o Flamengo foi algo que aconteceu naturalmente, os anos foram se passando, pude ter sucesso.
Léo mudou. Adotou o penteado moicano em 2006, inspirado no inglês David Beckham, e não tirou mais. Virou trintão, tem 33 anos, e pai de Maria Eduarda (seis anos) e Isabella (quatro) depois da chegada à Gávea. Ganhou cabelos brancos, aprendeu e ensinou. Foram muitos jogos, muitos dias dentro de concentrações, muito tempo longe da família, das filhas, da mulher (Camila). Ele diz que valeu a pena.
- Tive muito mais sucesso do que insucesso. E eu só tenho a agradecer a todo mundo. Desde o porteiro, pessoal da faxina, vejo que todo mundo gosta de mim e a recíproca é verdadeira. Pessoas que passaram aqui no Flamengo e hoje não estão mais aqui. Jogadores, treinadores, cada um foi importante demais para eu crescer profissionalmente e pessoalmente. Só tenho a agradecer. Não imaginava alcançar essa marca de 400 jogos, ser um dos jogadores de linha em atividade que mais jogaram pelo mesmo clube. Fico feliz.
Entre os jogadores da Série A, só Fernandes jogou mais. O meia-atacante já disputou 401 jogos pelo Figueirense. Segundo dados do Flamengo, o jogo de número 400 mantém Léo Moura na 18ª posição na lista dos jogadores que mais vestiram a camisa rubro-negra. O contrato dele termina em 31 de dezembro. Se renovar, ele pode ultrapassar, por exemplo, o ex-lateral Leandro, que tem 418. Júnior é o recordista, com 876.
Léo vai comemorar trabalhando. O clube prepara uma placa e uma camisa com o número 400 às costas para entregar ao jogador depois da partida, na volta ao Rio. Ao pisar no gramado do Beira-Rio, terá muita gente em mente, mas uma pessoa em especial.
- A primeira pessoa que eu tenho que agradecer é meu pai (José Carlos). Esse foi um cara que eu lembro que com nove anos ele me trazia para treinar na escolinha, foi um cara que batalhou muito para eu chegar até aqui. É até difícil de falar (Léo se emociona). Ele nunca deixou faltar nada em casa, mas sempre enfrentou as dificuldades para realizar meu sonho de um dia jogar futebol. E hoje sei que ele está muito feliz, me acompanha, vai a todos os jogos. Ele é uma das pessoas mais felizes de me ver como um jogador profissional, realizado no futebol. A primeira pessoa que penso é ele, foi o idealizador desse projeto de me tornar um jogador de futebol.
A pedido do GLOBOESPORTE.COM, Léo Moura listou alguns dos momentos mais marcantes desses sete anos e 399 jogos pelo Flamengo. Jogos inesquecíveis e para esquecer, gols que estão detalhados em sua mente, amigos especiais, histórias boas e ruins. Tantas que ele precisou se esforçar para escolher.
Os três jogos mais marcantes
Flamengo 1 x 0 Vasco - final da Copa do Brasil de 2006
- Por ser o primeiro título, acho que para mim ficou marcado porque eu havia chegado recentemente, no meio de 2005, tivemos um ano muito ruim, difícil, de fuga do rebaixamento, e no ano seguinte podendo disputar a final da Copa do Brasil, as coisas foram aparecendo devagar, a situação de disputar o título e ainda mais contra o rival. Aquilo ali se tornou um título muito especial por ser o primeiro, por ter sido no ano do nascimento da minha primeira filha (Maria Eduarda). Por isso que coloco como um dos principais, entre os mais marcantes.
Flamengo 2 (4) x (2) 2 Botafogo – final do Carioca de 2007
- Foi disputa de pênaltis. O último pênalti caiu logo para mim. Se não me engano, fui o terceiro ou o quarto a bater e alguns jogadores do Botafogo foram perdendo e fiquei imaginando: será que vai cair para eu decidir? E não deu outra. Dali do meio-campo até a marca do pênalti eu vi a responsabilidade de que milhões de torcedores estavam preparados para comemorar o título. É uma responsabilidade grande numa disputa de pênaltis, num clássico, ainda mais sendo uma final. Fui confiante, não tão tranquilo, porque o caminho parece uma estrada que não tem fim, meu irmão. Você vê o estádio todinho esperando aquela batida, e fazer aquele último gol dando o título para o Flamengo fica marcado. Foi a primeira vez que decidi uma disputa de pênaltis, por isso que é tão marcante assim. Você espera bater, mas não espera que seja o último pênalti para decidir um título. Ali eu fui abençoado por Deus.
Flamengo 2 x 1 Grêmio – última rodada do Brasileirão 2009
- Foi um título que muita gente não acreditava, que a gente vinha numa situação em que estava abaixo do décimo colocado. E jogo a jogo fomos colocando na cabeça que nosso grupo tinha condições. E as situações foram aparecendo, foi ficando mais perto até esse dia do último jogo, de disputar um título brasileiro depois de tantos anos com o Flamengo na fila esperando, num Maracanã completamente lotado. Vivendo aquilo ali. Um dia eu sonhei que iria disputar um título ali, mas não pensava que seria um título brasileiro e no Maracanã. Então, passa aquela imagem, todo aquele filme. Lembro que a gente estava em Teresópolis se preparando para esse último jogo, vindo no caminho ia passando um filme de tudo que tinha acontecido na carreira, de estar ali disputando um título no Maracanã. Por também ser tão demorado foi especial. Eu entrei para a história do Flamengo, que não conquistava o título há 17 anos. No último título brasileiro eu era moleque. Estar ali realizando um sonho de milhões de torcedores não tem como não ficar emocionado.
Os três gols mais marcantes
Gol contra o Cruzeiro no Brasileirão 2007
- Foi uma jogada até estranha (risos). Quem fez a jogada pelo lado do campo foi o Souza, que é centroavante, que não tinha de estar ali. Ele cruzou para o Toró, Toró escorou de cabeça. Não era nem para o Toró estar ali. Normalmente era eu fazendo pela lateral. Acabou que mudou tudo, o Toró ajeitou a bola e pude pegar de primeira. Acho que nem o Fábio (goleiro do Cruzeiro) esperava aquela bola. Ela veio pedindo para chutar, pude acertar, foi um chute forte e sem defesa.
A cobrança de pênalti decisiva na final do Carioca de 2007
- Quando saí do meio-campo, já fui com o canto definido. Não espero para chegar na hora e decidir. Se o goleiro acertasse o canto da batida, seria mérito dele também. Como sempre gosto de bater forte e um pouco no alto, foi isso que aconteceu. Eu pude bater mais firme, no alto, sem dar chances para o goleiro. Procurei definir antes e mentalizar o momento do gol.
Gol contra o Universidad Católica do Chile de falta, estreia da Libertadores de 2010
- Esse gol aí, na hora que saiu a falta, fomos Adriano e eu para a bola, aí eu pedi para bater. Ele até falou: bate no terceiro homem da barreira que ela vai entrar. Aí me concentrei naquele momento para mirar no terceiro homem da barreira e consegui colocar com perfeição por cima. Depois ele veio comemorar comigo e falou. Às vezes numa cobrança de falta uma dica do companheiro é importante e eu pude aproveitar essa dica dele e ter o mérito de pegar bem na bola e ela entrar. E tendo um cara especialista no jogo que era o Zico, que depois veio falar comigo, foi um gol muito especial. Sempre gostei de bater falta, mas mais na categoria de base. Aqui no Flamengo eu fiz alguns, mas sempre gostei de treinar. Não tenho treinado, estou voltando agora, mas sempre gostei de bater.
As três maiores decepções
Derrota de 3 a 0 para o América do México - Libertadores de 2008
- Essa é uma triste lembrança que tenho aqui no Flamengo porque viemos de um jogo muito bom lá no México, praticamente definido. Naquele jogo eu estava fora, alguns jogadores foram poupados, porque logo já tinha a final aqui (do Carioca). Naquele jogo de lá, nós praticamente definimos na nossa cabeça a passagem para mais uma fase. E viemos para esse jogo aqui concentrados, mas tranquilos porque o resultado estava nas nossas mãos, só dependia de nós mesmos. Acabou que aconteceu aquela tragédia no Maracanã lotado. Para sair dali foi complicado, não consegui dormir naquela noite. Era um jogo que você tinha na mão para classificar e vê a vaga saindo pelos dedos. Foi um momento muito triste. É muito difícil recuperar.
Derrota por 2 a 1 na final da Taça Rio de 2010 para o Botafogo
- A gente vinha numa sequência muito boa. Até nas finais contra o Botafogo (o Flamengo venceu o rival nas decisões de 2007, 2008 e 2009). A gente esperava ganhar mais um campeonato, quando o Adriano naquela ocasião teve a infelicidade de perder o pênalti. Ele bateu bem o pênalti, ele bate muito bem, mas o Jefferson naquela hora pegou com a pontinha do dedo. Perdemos o título com a consciência de que venceríamos. A nossa sequência de títulos era boa, sempre decidindo contra o Botafogo, e acabou que paramos nesse ano de 2010.
Eliminação na Libertadores de 2010 com vitória por 2 a 1 sobre o Universidad de Chile
- É a eliminação que mais dói. Quando você vence e não consegue passar. Jogando na casa de um adversário que sabia jogar a Libertadores, que estava bem, a gente conseguiu fazer os gols, mas não foram suficientes para passarmos. Por isso que fica aquele gostinho de querer mais uma Libertadores. Além do que nós fizemos naquela, fazer mais um pouco. Mesmo com os gols, não tivemos capacidade de passar.
Os três melhores amigos
Adriano e Léo Moura, dois amigos em um treino do Flamengo (Foto: Richard Souza / Globoesporte.com)
Renato Augusto - "Foi um cara especial que jogou aqui comigo, me ajudou a crescer".
Fábio Luciano - "Aprendi a conviver, respeitar e tirar proveito do que é ser um capitão, um ícone".
Adriano - "Não conhecia, mas quando veio para o Flamengo pude me aproximar dele, concentrando junto, conversar sobre a vida profissional e pessoal. Um cara de quem pude ter amizade e carinho sincero".
Os três "causos" mais curiosos
Léo explode...de raiva
- Vou citar uma história chata, foi aquele momento que tive com a torcida (em 2 agosto de 2009, o Flamengo empatou com o Náutico por 1 a 1 no Maracanã, pelo Brasileirão. Léo fez o gol rubro-negro e xingou a torcida na hora de comemorar). Hoje, pensando mais friamente, mais experiente, eu vejo que aquilo ali foi direcionado, alguma parte ali. Como a gente precisava vencer aquele jogo e foi no ano em que conseguimos o título, dei uma extravasada, estava com aquilo engasgado, porque a gente precisava de uma vitória. Mas eu peço perdão, porque tenho a humildade de reconhecer que errei naquele momento. Por ser flamenguista de coração, por amar essa torcida, foi um momento que eu digo para ninguém fazer, porque foi um virgulazinha nessa história tão bonita.
O estilo Joel
- Em 2005, com o Joel (Santana), a gente precisava ganhar sete jogos e foi fazer o primeiro jogo em Caxias do Sul (contra o Juventude), os caras fizeram 1 a 0. A gente não podia perder. Se não me engano, ele tirou um meia e colocou mais um atacante. Aí ele citou um ditado no vestiário que todo mundo na hora achou engraçado. Ele falou: vamos para cima dos caras, calça de veludo ou bunda de fora. Ou vai ou racha (risos). Foi um momento assim engraçado, e o jogo estava pegando fogo, a gente não podia perder. Acabou que ali a gente conseguiu empatar o jogo, quase com possibilidade de virar. Dali começou uma caminhada em que a gente não perdeu os jogos.
Basquete do hexa
- Foi no último dia que ficamos em Teresópolis. Véspera do jogo é normal que todo mundo fique trancado no quarto. Nesse dia a gente não conseguiu treinar por causa do tempo, estava chovendo bastante. A gente foi para o ginásio. No lugar do futsal, fizemos um jogo de basquete para descontrair. Em véspera de jogo normalmente você faz um rachão e nesse dia fizemos um jogo de basquete, começamos a jogar. O grupo estava concentrado para jogar a final (contra o Grêmio, última rodada do Brasileirão 2009), foi uma situação engraçada, a gente trocou os pés pelas mãos. Eu só fiquei observando. O Pet que foi bem, sempre gostou de jogar. Surpreendeu um monte de gente